terça-feira, 13 de julho de 2010

FERNANDO NUNES

INTIMIDADE

Era uma vez uma pequena aldeia, suspensa na vertente da montanha, como se aquela cordilheira que se desencadeava a uma dúzia de metros do lago da planície verdejante e subia numa quase linha vertical perfeita até ao pico mais afiado e próximo do céu, tivesse sido tocada por alguma mão das divindades das neves. A uns escassos duzentos metros do topo, a parede rochosa era quebrada bruscamente na sua verticalidade por uma terra plana, que nunca fora medida em quilómetros, mas que em passos lentos de velhice, demorava meia hora a ser percorrida, na direcção de qualquer um dos quatro horizontes. Aí, a minúscula aldeia, de casas construídas com pedras de calcário, brilhava no cintilar de uma luz quase líquida. Brilhava ainda na serenidade do seu silencioso isolamento e ao redor do braseiro de uma lareira, nas longas horas de reclusão, impostas pelos dias escurecidos dos temporais de Inverno. Contudo, era nos olhos dos seus habitantes que toda essa infinita luminosidade se evidenciava, como cristais, espelhando a verdade da alma de cada um. A aldeia parecia estar mais próxima do alto, do que do mundo terrestre ( . . .).

FERNANDO NUNES - Livro SOMBRAS DA ALMA

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